Malvinas News Nosso portal de notícias
Nacional
"Padre Palópito"
Padre Palópito durante missa. (Foto: Reprodução) |
O encontro foi marcado para as 13h50 da quartafeira 13. No local combinado, um senhor
alto, de cabelos grisalhos e com as pontas escuras por causa da tintura antiga desce de um
carro branco da marca Mitsubishi.
Ele caminha até a frente do prédio, abre a porta de aço,
liga as luzes e já começa a mostrar seu imóvel, à venda por R$ 2,5 milhões.
O térreo é um
minimercado com caixas registradoras, freezers e prateleiras com algumas mercadorias
que haviam sobrado da época do fechamento, no final de fevereiro.
A maioria produtos
importados, como vinhos e frios, de muita qualidade e preços altos.
Afinal, apesar de estar
localizado no bairro São Lourenço, em Bertioga, a 120 km de São Paulo, o comércio fica a
metros da Riviera de São Lourenço, condomínio conhecido por reunir veranistas de alto
poder aquisitivo.
No segundo andar, uma sala onde funcionava uma pizzaria tem 15 mesas
empilhadas, balcão com as louças usadas no restaurante, cozinha equipada e uma
máquina de fabricação de massa de pizza.
“As vendas foram boas, mas não tive lucro.
Investi muito mais dinheiro do que o valor que estou pedindo”, diz o proprietário, que
desistiu do empreendimento, administrado por sua esposa, segundo ele próprio, por não
levar jeito como empresário.
“Penso em sair do Brasil”, diz. Aos corretores, pede que
divulguem o preço do imóvel como sendo de R$ 4 milhões. O comprador se mostra
interessado, mas combina de retornar em breve com uma resposta.
Esse poderia ser o início de uma transação de compra e venda de um imóvel não fosse o
dono do empreendimento o padre Osvaldo Palópito, 60 anos, que ficou conhecido no início
deste ano ao ser afastado da igreja de Santo Expedito, em São Paulo, uma das mais
visitadas do País, por ter desviado ao menos R$ 2 milhões de sua paróquia.
E o candidato a
comprador a reportagem de ISTOÉ simulando interesse no negócio.
O desvio milionário é o
golpe conhecido, mas está longe de ser o único, uma vez que, como sacerdote, Palópito fez
voto de pobreza e castidade e não poderia ter bens, nem manter relação amorosa com uma
mulher.
ISTOÉ descobriu que o sacerdote possui, além do empório e da pizzaria, uma
cobertura duplex na Riviera de São Lourenço, anda em carros importados e leva vida de
casado.
Mais magro, com a barba por fazer e um pouco abatido, Palópito ainda mantém a
postura simpática, a extroversão e o carisma que o tornaram um padre querido pelos
devotos do santo das causas urgentes.
Ele também conquistou os fiéis vendendo seus CDs
– tem seis – e fazendo shows pelo País.
Desde 2003 à frente da paróquia, que chega a
receber 250 mil pessoas no dia do padroeiro, em 19 de abril, o sacerdote tinha funções
pastoral e administrativa e lidava diretamente com dízimos e doações, fonte majoritária de
renda para a manutenção da igreja.
Após receber denúncias de pessoas que trabalharam
com ele, a corregedoria da Polícia Militar – Palópito é capelão militar e, por isso, está
submetido às regras da corporação – iniciou uma investigação em setembro de 2014 na
qual identificou “indícios de desproporção entre o patrimônio do capelão e seus
vencimentos”.
A investigação foi finalizada com indicativo de acusação por crime de
peculato, no qual um servidor público se apropria de dinheiro ou qualquer bem a que tenha
acesso em razão do cargo, e encaminhada à Justiça Militar, que deverá julgar o processo.
O sacerdote ingressou na corporação por meio de concurso e ocupava também o posto de
tenentecoronel.
Em 31 de janeiro, ele pediu sua transferência para a reserva, como se
chama a aposentadoria dentro da PM.
Essa manobra lhe garante que, mesmo que seja
considerado culpado e perca a patente, mantenha alguns benefícios.
As Riquezas do Sacerdote (Foto Reprodução |
Depois de o escândalo vir à tona neste ano, a luxuosa cobertura duplex na Riviera de São
Lourenço foi colocada à venda por R$ 2,65 milhões.
Em conversa com a reportagem, a
corretora responsável pelo imóvel afirmou que a negociação foi fechada no início de maio
pelo valor R$ 2,3 milhões “porque o proprietário estava envolvido em um escândalo e
precisava do dinheiro rapidamente”.
Um documento no rack da sala de estar com
informações sobre retirada de equipamento da TV por assinatura confirma o nome do
assinante: Osvaldo Palópito. O apartamento foi vendido com permuta por outro na Riviera
no valor de R$ 1,6 milhão.
O restante foi pago em dinheiro, à vista. A cobertura duplex tem
325,07m², vista para o mar e piscina.
Todos os eletrodomésticos são de última geração.
O mercado está registrado no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) em nome de
Isabel Cristina Firmino.
Segundo moradores de São Lourenço confirmaram à reportagem,
entre eles uma exfuncionária do empório, Isabel era apresentada pelo padre como sendo
sua esposa.
O próprio Palópito confirmou, na quartafeira 13, enquanto mostrava seu
estabelecimento, que “dona Isabel”, nome que aparecia em cartazes pedindo organização
na cozinha da pizzaria, era sua mulher.
No mesmo CNPJ, o email de Palópito consta no
campo “endereço eletrônico”.
Ainda de acordo com os moradores da região, o casal era
conhecido por ostentar. Eles circulavam pelo condomínio de luxo com dois carros da marca
Mitsubishi e não hesitavam em dar detalhes sobre suas compras e viagens.
À reportagem,
o padre chegou a afirmar que queria trocar seu automóvel por uma BMW e citou um tour
feito em uma vinícola em Santiago, no Chile.
Muitos moradores nem sabiam que o dono do
empório e da cobertura duplex era o líder de um dos pontos de peregrinação católicos mais
frequentados do Estado e tomaram conhecimento de sua vida dupla apenas quando as
notícias sobre o inquérito da PM vieram à tona.
Um dia depois do encontro com Palópito, ISTOÉ entrou em contato por telefone com ele e
informou sobre o real objetivo da visita ao imóvel e sobre a publicação desta reportagem.
Ao ser questionado sobre o tempo em que estava casado, já que havia dito um dia antes
que “dona Isabel” era sua esposa, o capelão negou ter uma companheira.
“Nunca fui
casado. A gente é amigo. Ela é proprietária.”
Ao final da ligação, Palópito, tranquilo,
perguntou se, por causa da visita, havia de fato interesse na compra do imóvel. Mostrouse
desapontado com a resposta negativa e agradeceu o contato.
Sobre o patrimônio, Paulo
Ornellas, seu advogado, afirma que o cliente trabalha há 30 anos e que não tem onde
gastar seus rendimentos – só se esqueceu que sacerdócio não é trabalho e que os padres
têm apenas uma ajuda de custo, chamada côngrua, no valor médio de dois salários
mínimos.
No momento adequado, após a abertura do processo, ele irá justificar seus bens
perante a Justiça, disse o advogado. “O inquérito corre em segredo de Justiça, estou
esperando a tramitação para falar sobre o caso.”
A paróquia de Santo Expedito é uma capelania militar.
Por isso, Palópito responde tanto à
Igreja Católica quanto à corporação. Assim, se for considerado culpado pelo crime pelo qual
foi investigado, será afastado definitivamente da Polícia Militar.
Segundo a secretaria de
Segurança Pública do Estado de São Paulo, o padre também terá de responder
criminalmente. De acordo com o Ordinariado Militar, espécie de arquidiocese para as
Forças Armadas e polícia, Palópito está afastado do ministério sacerdotal enquanto tramita
o inquérito.
Desde que o escândalo veio à tona, não houve nenhum contato entre o padre e
seus superiores.
No âmbito eclesiástico, se provado o fato de Palópito ter uma companheira, a punição mais
dura seria o afastamento do exercício do ministério por concubinato, como explica o padre
Edson Chagas Pacondes, professor da Faculdade de Direito Canônico São Paulo Apóstolo,
ligada à Arquidiocese de São Paulo.
“Em relação à questão financeira, a pena seria o
ressarcimento”, afirma. “Já a excomunhão é um caso mais esporádico e só aplicado quando
há relação com questões religiosas, como negar a própria fé.”
Se pensarmos em fé como um compromisso com a caridade, a humildade e a justiça, usar as doações e o dízimo dos
fieis para enriquecimento próprio não é também uma maneira de negála?
Fonte IstoÉ Independente |
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe aqui, seu comentário.